O que nos impede de viver
Em entrevista para uma TV portuguesa, o cardeal José Tolentino Mendonça foi muito inspirador. Ao assisti-lo fiquei com vontade de compartilhar pensamentos dele e algumas reflexões minhas, que ficaram aqui, misturadas. Vivemos hoje em uma sociedade de risco. A riqueza é concentrada, mas os perigos são compartilhados. O tempo é de medo, confinamento, incerteza, vulnerabilidade, emergência. Estamos diante de extremos – o melhor e o pior de nós. São muitas as perguntas – Como chegamos até aqui? O que construímos como sociedade? Tudo pode piorar e esta pandemia pode ser a oportunidade de um novo estar no mundo. O processo gerado pelo vírus acelerou as assimetrias e egoísmos do velho mundo? Ou vai nos fazer entender que estamos no mesmo barco, diante da mesma tempestade? O escritor Guimarães Rosa já dizia: “viver é perigoso”. Juntos, experimentamos a vulnerabilidade e chegaremos no tempo de renascer e dar valor à vida humana. A crise é da sociedade que criamos e não podemos negar dores e sofrimentos que nos esmagam. A pandemia não criou problemas. Eles já existiam e foram escancarados. O tempo agora é de solidariedade. Abrir mão do imediato e encontrar formas de transformar muros em possibilidades de trocas. O que antes não víamos, hoje é um impulso para garantir condições mínimas de sobrevivência. A vida precisa estar acima da economia. Até porque economia sem vida não existe. A pandemia tirou o véu de questões como a dos velhos. Se eles são apenas números, sairemos diminuídos como comunidade. Não se envelhece para morrer. Envelhecemos para nos saciar da vida. Devemos honrar nossos velhos, sua experiência, sua sabedoria. Se negarmos essa população tão grande, estamos bem mais doentes do que pensamos. São nossos pais, nossos avós, nossas raízes, nosso prolongamento, nossa reserva de amor, memória, sabedoria. Do que veio antes de nós, do que nos gerou. E do que é o nosso destino porque queremos envelhecer e ser respeitados. Precisamos pensar em modelos diferentes de acolhimento e de vida familiar. Não simplesmente cruzar os braços. Fomos levados para um presente sem horizonte e as primeiras vítimas são os velhos, que representam um tesouro para o qual não damos valor porque não olhamos para o que nos falta. Alguns de nós deixaram de valorizar os velhos quando nossa atenção volta-se para a sociedade de consumo. E eles ficam de fora porque não temos tempo, envolvidos com produzir e gastar. Mas há outras escolhas possíveis. Velhos são frágeis, mas resilientes. Andam devagar, mas pensam depressa. São sensíveis e transmitem conhecimento. A vida não acaba quando termina o que chamamos de vida ativa. Há uma atividade interior de pensamento, de cuidado com o outro. Empurramos a velhice como uma ideia de fim, mas isso passou. O mundo será muito diferente em nós e fora de nós e a velocidade que nos move impede o viver. Não vamos esquecer os momentos difíceis. As crises sociais e econômicas ampliaram e encontrar soluções mais justas e fraternas, ser mais humanos é o que nos cabe.
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